22 de fevereiro de 2008

Desenhos Satânicos


O mundo é um lugar engraçado.

Depois do atentado de 11 de Setembro, já houveram cerca de 4.000 atentados terroristas pelo mundo afora. Os jornais noticiaram com a frieza de sempre, e ninguém se manifestou.

Mas quando um jornal dinamarquês publicou algumas charges ironizando os terroristas e a forma deturpada como eles usam o Islã para justificar seus atos, todos os países islâmicos protestaram: povo nas ruas, fogo em embaixadas, colocaram a cabeça dos cartunistas a prêmio, etc. Outro dia mesmo prenderam dois homens que estariam tramando o assassinato de um dos cartunistas envolvidos no "escândalo".

Em nome da liberdade de expressão, diversos jornais do mundo inteiro republicaram as charges dos cartunistas dinamarqueses, em um protesto contra o medo e a censura que ameaçam mais uma vez a imprensa. Essa polêmica toda reacendeu velhos debates, não somente sobre a rivalidade entre o mundo islâmico e o cristão, mas também sobre a liberdade de imprensa e de expressão. Será que é justo matar pessoas só por causa de um desenho impresso em um jornal? Até que ponto a sensibilidade das pessoas pode ir? Vale a pena matar alguém em nome da sua crença religiosa?

Minhas reações a essa confusão toda são adversas. O primeiro "eu" que reage a essas notícias é o ateu: como é que as pessoas têm coragem de se exaltar tanto, a ponto de queimar embaixadas e tentar matar pessoas, só por causa de um homem invisível que governa o universo? Essa briga do Islã contra os cristãos é só um bando de idiotas se matando uns aos outros para ver quem tem o melhor amigo imaginário. Todos os profetas e criaturas mitológicas em geral sempre ensinaram a mesma coisa: viva e deixe viver, os últimos serão os primeiros, relaxa senão não encaixa, vai cuidar da sua vida e não enche o saco dos outros. É só ler os textos sagrados, está tudo lá. Mas para quê ler os textos sagrados se você pode simplesmente imitar as pessoas à sua volta? É muito mais prático e cômodo - e você nem precisa pensar. É assim que surgem as Ku-Klux-Klans e as Al-Qaedas da vida.

Depois vem o "eu" desenhista, cartunista, quadrinista, seja lá o que for. Esse eu acha tudo isso lindo! O poder do desenho! Vejam do que um simples desenho é capaz! Milhares e milhares de livros e teses de doutorado são escritos e lançados todos os dias fazendo análises e previsões sobre os conflitos religiosos e as guerras do mundo inteiro. E aí um belo dia um jornal da Dinamarca publica alguns desenhos com piadinhas inocentes e irônicas. E o que acontece? Uma briga de nível mundial! Explosões! Assassinatos! O povo nas ruas! Tudo por causa de alguns cartuns e charges. Lindo, lindo...

E finalmente vem o meu eu analista político, aquele que tenta entender o cenário geopolítico mundial todos os dias - e sofre muito com isso! - e diz "exatamente como eu sempre digo". O que é que você sempre diz, eu mesmo? O que eu sempre digo, querido eu, é que o mundo não se divide entre religiões, nacionalidades, nem mesmo cores de pele. O mundo se divide em dois tipos de gente: as que têm senso de humor e as que não têm senso de humor.

Isso explica muita coisa, inclusive a colonização dos Estados Unidos, o fim do Comunismo, a ascensão do Nazismo, e até mesmo os conflitos religiosos de hoje em dia.

Pensa bem. Você é um muçulmano. Aí um jornal dinamarquês publica uma charge zoando o seu profeta. O que você faz? Uma charge zoando a Dinamarca? Não... você explode uma embaixada. Porra! Isso não faz o menor sentido!

Certa vez eu vi uma pesquisa feita em um site de chargistas dos Estados Unidos. Eles perguntaram aos seus cerca de 90 colaboradores como eles se posicionavam politicamente. Apenas 1 deles respondeu que era republicano. Só um! Não existe "humor de direita" ou "humor conservador". Lembram-se da "piada mais engraçada do mundo", do Monty Python? É exatamente isso: os nazistas não sabiam fazer piadas. Por isso eles eram nazistas.

Muita gente confirma que o senso de humor e a capacidade de fazer piadas são um reflexo de inteligência e bom uso do nosso amigo cérebro. Sendo assim, acho perfeitamente natural que pessoas idiotas não consigam relevar uma simples piada - e explica por que diabos eles não sabem fazer contra-piadas. Combatem a ironia com bombas, e o sarcasmo com tiros.

E o que é que eu posso fazer? Rir. Rir para não chorar. Sempre rir. Etc.

Fica aqui aberto o meu convite a todos os muçulmanos do mundo: se vocês tiverem uma boa piada de Dinamarquês para contar, me digam que eu ilustro com o maior prazer.

Melhor ainda: estou dando aulas de desenho grátis para todos os muçulmanos do mundo. Podem me procurar a qualquer hora do dia ou da noite. Eu vou ensinar qualquer um de vocês a desenhar bem o suficiente para fazer uma charge ou um cartum político para que vocês possam se defender dos nefastos cartuns dinamarqueses.

(mas se você for republicano, não me procure)

2 comentários:

Anônimo disse...

Eu concordo com grande parte do que você disse, mas tem um problema nessa questão da charge: o da diferença. O islã, não somente os fanáticos, tem uma relação bem diferenciada com a religiosidade em relação ao ocidente moderno. O jornal que publicou as charges o fez como provocação - direitistas raivosos que são - e se recusou em anos anteriores a fazer o mesmo concurso usando Cristo como tema...

Vale à pena matar por charges? Pra alguns vale, infelizmente, e em todo caso a provocação veio antes do humor.

Nicolau disse...

Claro que existe humor de direita, nos EUA: dos outros cartunistas democratas...