24 de abril de 2008

Maconha!!!


Maconha é um dos assuntos mais esquisitos que eu conheço. O medo que as pessoas têm dela - até de pronunciar a palavra - é tão irracional e sem sentido que dá até medo. Pessoas que você sempre julgou sérias e racionais se transformam em demônios cheios de ódio quando tocam no assunto, muito embora não façam a menor idéia do que estão falando. Sem contar que basta tocar no assunto para todo mundo automaticamente pensar que você fuma.

Como tenho alguns links interessantes sobre o assunto, e estamos chegando perto do dia da Marcha Mundial da Maconha, achei interessante abordar o assunto aqui no blog.

Vou começar falando sobre a opinião que o público geral tem sobre a maconha. Vocês certamente conhecem o programa "Sem Meias Palavras", que imortalizou o grande filósofo Jeremias no YouTube. Na matéria abaixo, eles mostram um bêbado chamado Leonaldo. O cara está caído, dormindo no chão da delegacia, muito mais bêbado do que o Jeremias. Ele conta, orgulhoso, que encheu a cara de cachaça e quebrou vários carros, além de ter agredido um policial. Até aí tudo bem. Aos exatos dois minutos de duração do vídeo, o repórter pergunta se ele fumou maconha, e o bêbado levanta a cabeça assustado e diz, enfurecido: "eu sou cabra homem!". Quer dizer, na cabeça dele, beber 4 latas de cachaça, quebrar carros e agredir policiais, é normal, mas fumar maconha, não, isso é coisa de viado, ou de covarde, ou seja lá qual for o antônimo de "cabra homem".



Bom, e o que que eu acho sobre isso? Eu acho que é só uma planta. Aliás, muita gente acha isso também, tanto que lançaram um livro chamado "It´s Just A Plant". Ele é direcionado para crianças, e explica o que é maconha, de onde ela veio, por que ela é proibida, etc. Óbvio que não é nenhum clássico da literatura contemporânea, mas achei muito digno eles terem direcionado o livro às crianças. Conheço muitos adultos que fumam maconha e têm filhos, e já vi as pessoas comentando horrorizadas que eles fumam na frente das crianças. Será que seria melhor esconder tudo delas? Fingir que Papai Noel existe, e inventar outras mentiras para explicar o mundo, ao invés de falar a verdade?

Acho que esse raciocínio é exatamente a raiz desse e de vários outros problemas: nós somos ensinados, desde crianças, a preferir a mentira e o simulacro ao invés da coisa real. Ninguém quer saber o outro lado das questões, ou se aprofundar nos assuntos. É muito mais fácil - e foi assim que nossos pais e professores nos educaram - agir baseado apenas no que já sabemos e espalhar nossos preconceitos como se fossem um vírus.

Se você quiser fazer uma leitura objetiva sobre a história da maconha no Brasil, esse artigo muito interessante do Sérgio Vidal conta em detalhes a história da planta, desde suas origens no Afeganistão até os dias de hoje. Atenção para as fotos!

E se você quiser se manifestar a favor da legalização da maconha no Brasil, no próximo dia 4 de Maio, domingo que vem, vai haver uma marcha internacional a favor da legalização da planta e de todas as suas formas de consumo - até mesmo do fumo! É bem provável que a grande mídia ignore completamente o evento, então recomendo a todo mundo que participe pelo menos para ver o que vai acontecer, porque certamente o Fantástico e o Jornal Nacional não vão nem mencionar o acontecimento, muito embora existam 222 cidades brasileiras cadastradas no evento.

Para saber mais, entre no site da marcha em http://www.marchadamaconha.org/

E, para reforçar o velho e gasto clichê, vou fechar com uma música do Bob Marley!

"Por que não podemos ser o que queremos ser?"



(sim, aquele ali é o Toquinho, e o de baixo é o Chico Buarque...)

3 comentários:

Nicolau disse...

Como assim "apenas" uma planta? Nenhuma planta o é apenasmente. Se não nenhuma, poucas... Talvez as samambais.

Cogumelos psicodélicos também são apenas fungos? Já a sálvia é outra plantinha convencional, e noz moscada é apenas uma especiaria, digo, uma ordinaria. Ayahuasca, coca, milho e batata eram apenas vegetais cultivados por americanos nativos muito por acaso.

O salgueiro também, é apenas uma árvore de onde se tiraram remédios como quaisquer outros. Hipócrates e os sumérios simplesmente ignoravam que era apenas uma árvore, bem como os químicos que eventualmente isolaram o princípio ativo da aspirina. Que é por sua vez apenas uma molécula, como também é o DMT, a metanfetamina, heroína e LSD. LSD descoberto a partir do ergot, apenas um outro funguinho que dá no trivial trigo, causando apenas mortes numerosas em populações que o consumiram inadvertidamente. De forma semelhante consumiu Sócrates um chá feito de apenas cicuta. Ele era apenas um ateniense, e também verificou-se ser apenas um mortal.

Na Índia, a papoula convive com a flor de lótus, onde são consideradas apenas flores, pastadas pelas apenas-vacas que habitam a região.

Essa relativização generalizadora assim é uma retórica infantil, que não leva a nada. Infantil no mau sentido, e não no de que deve ser usado em livros infantis.

Se é apenas uma planta, fumem samambaia.

Igualmente superficial é essa insistência em ligar a maconha à produção do cânhamo. Esse assunto não se esgota?

Existem diversas variedades da cannabis. Algumas melhores para produção têxtil, algumas melhores para dar barato. Imagino que algumas sejam melhores para fazer haxixe, e algumas talvez sejam melhores para servir de bio-combustível, e talvez apenas fixação de carbono. Eu até entendo mencionar isso num discurso como forma de diminuir o impulso irracional contra a planta em geral, mas o pessoal exagera. Mesmo que só houvesse uma variedade da planta, ainda seria admissível um estado tornar ilegal o fumo do vegetal... Que correlação é essa que se tenta implicar entre o uso industrial e o "medicinal" da planta? Isso é um sofisma.

Por falar na questão da legalização da planta, o que dizer da coca, que dizem por aí ser sumária e exageradamente proibida no Brasil, tornando a venda de coca-cola uma contravenção? Cadê a marcha da coca-cola?

Cadê a marcha do haxixe, a marcha da heroína, a marcha da noz moscada?? Opa, não, essa é legalizada... Bem como tabaco, álcool e café. Esses drogaditos não precisam marchar, podem curtir sua substância numa boa, enquanto estas plantas constituírem ali o brasão de armas de nossa nação.

Mas curtem na frente dos filhos?... Que conversa é essa achar lindo fumar maconha na sala de estar? O Ray Charles naquele filme da vida dele dá uma demonstração de hipocrisia por guardar a heroína "pra estrada", ao invés de dar uns picos durante a ceia de Natal?

Hipocrisia é uma coisa muito mais sutil do que segregar atividades de sua vida a diferentes contextos e ocasiões. Hipocrisia é aquela coisa dissimulada, absolutamente incoerente mesmo. É um político fanático cristão que dá um jeito de fechar um puteiro na zona leste, mas freqüenta outro na zona oeste.

Até parece que todos fumantes de cigarro, cachimbo e charuto de tabaco insistem em praticar seu ritual na frente das criancinhas vendo desenho animado no sábado de manhã. Do que eu entendo do processo, é até mesmo algo que alguns destes evitam fazer justamente para extrair mais prazer da experiência.

Uma coisa de que eu sinto falta em toda a discussão sobre drogas é de que se fale dos rituais, costumes. Ficam nessa de falar que é apenas uma substância, simplificar tudo a uma questão de poder vender o bagulho no Pão de Açúcar ou não...

Falar em "simulacro" não é minha especialidade, mas da forma que eu entendo, pouco ou nada tem a ver com a alienação e o preconceito (que não deixam de ser preocupantes sim). Simulacro ao meu ver é essa coisa de um cidadão descolar uma droga qualquer, por mais fodida e distante da "coisa real" que possa ser, e considerar que está vivendo uma experiência de êxtase sem limites. É um simulacro de droga, um simulacro de diversão, simulacro de culturas ancestrais... Simulacros de experiências psicológicas e sensoriais empilhados uns sobre os outros. (Não que não possam haver por aí drogados intelectuais transcedentais profissionais. Tou falando daqueles boy que enchem o saco em show de rock, e dos meus vizinhos maconheiros fãs de Manu Chao.)

Duvido que o uso de drogas do doidinho arquétipo marchante pela maconha seja uma experiência comparável à do romântico usuário caipirão, dos candomblés e interiores nordestinos da vida. Duvido que se compare à experiência daquela velhinha no Marrocos que dá haxixe pra mulher do Brad Pitt no filme Babel. Tenho minhas dúvidas quanto aos níveis de transcendência espiritual vividos pelos Beatles, e menos quanto a alguns músicos da Jamaica.

Claro que isso tudo não justifica nada. Se um movimento quer lutar pela apenas-substância, por mais que o babaca aqui considere a cultura pós-moderna uma farsa de mal-gosto, lutem. Mas só garanto uma coisa: o governo está hoje muitíssimo menos preocupado com os descendentes de quilombolas que designam a maconha através de sei lá qual vocábulo de vernáculo Bantu, do que com jovens da classe média que não são muito bem sucedidos entre equilibrar o uso da droga e atividades recreativas relacionadas, com o enfrentamento de atividades típicas da vida de um adolescente urbano contemporâneo, como passar o inferno em escolas torturantes, ou ainda coisas mais agradáveis como lidar com pais alcoólatras.

O "erro histórico" na criminalização da ervinha talvez tenha que ser apenas aglomerado às outras dívidas históricas que o Lula falou que vai pagar criando vagas nas universidades pra todos cidadãos do país. Isto, por tabela, certamente exporia todas estas almas àquele agradável ambiente acadêmico cheio de maconheiros debochados que passam o dia falando sobre as maravilhas da produção da fibra do cânhamo, e sobre o consumo de maconha pelos senhores de engenho hipócritas dotados de homossexualismo latente e sabe-se lá mais o que. E falam mal do Tropa de Elite também. Maconha é de esquerda!

Por fim, que diabos tem a ver o Chico com essa história, por acaso ariola é alguma gíria pra maconha? Não seria mariola? E novamente, que que tem o Chico? Que eu saiba ele tem um histórico mais é de alcoolismo, um problema que geralmente empalidece qualquer questão maconheira.

É um assunto complicado. E que sei eu, um engenheiro careta, apenas um rapaz latino-americano com um "medo irracional" de usar PCP ou crack e experimentar a vida em toda sua extensão de possibilidades. Tantas plantas me fazem ver o problema como um abacaxi... ou talvez uma banana indescascável, em cuja casca freqüentemente escorregamos. E já dizia o poeta:

Then thank your God that I'm not aware
And thank God that I just don't care
And I guess I just don't know
And I guess I just don't know




(ah sim, mas é claro que heroína não tem absolutamente na-da a ver com maconha)

DONO.DO.SANATÓRIO disse...

grande texto!
ajudo a marcha com divulgação no meu blog. nem sabia da existência desse tipo de movimento.

Ana Cecília Leite disse...

comecei a escrever aqui mas depois não soube o que falar.
muito bom o texto.
até!