14 de outubro de 2008

Sub-prime na sua cara!

Saiu uma pesquisa do Gallup feita nos Estados Unidos entre 10 e 12 de outubro, com 1.269 pessoas. Margem de erro de três pontos percentuais.

  • 49% dos entrevistados não esperam a recuperação da economia por um longo tempo e vêem a crise como causa de uma mudança permanente na economia.
  • 47% dizem que o mau momento da economia é temporário
  • 91% dizem estar descontentes com o modo como o governo está resolvendo a situação.
  • 16% dizem confiar em George W. Bush e em sua equipe de assessores.
  • 80% dizem não acreditar que Bush será capaz de resolver a crise nos últimos meses de seu mandato.
  • 25% aprovam o governo Bush.
  • 71% desaprovam.
  • 63% dizem não acreditar que o republicano John McCain possa encerrar a crise.
  • 50% dos entrevistados não confiam nas propostas de Barack Obama para retomar o crescimento econômico.
Obama lidera na intenção de voto, com 51% contra 44% do rival republicano.


Nos Estados Unidos, a crise já começa a ser sentida nas ruas, e na cara das pessoas. O cidadão médio comum daquele país investe seu dinheiro na bolsa como nós brasileiros "investimos" na poupança. Ou seja, agora que os mercados despencaram e parece ter estourado uma bolha no sistema financeiro dos EUA, não foram apenas os grandes bancos e corporações que perderam dinheiro, mas toda a classe média que tinha sua aposentadoria e a universidade de seus filhos aplicados na bolsa também perdeu muito dinheiro. O Dow Jones já está acumulando uma queda de 40% em um ano.

Os estadunidenses que financiaram a compra de suas casas próprias no famoso "mortgage" também estão em maus lençóis. O valor da dívida do financiamento ultrapassou o valor real dos imóveis, e a tendência é que essa discrepância aumente ainda mais. Cerca de 10 milhões de famílias estão nessa situação.

O endividamento atual das famílias dos Estados Unidos já soma 140% do valor do PIB daquele país, o que equivale a aproximandamente US$ 19.600.000.000.000,00 (dezenove trilhões e seiscentos bilhões de dólares). Essa dívida remonta à recessão do ano 2000, quando a solução para a crise foi liberar o crédito como se não houvesse amanhã.

Esse amanhã havia, e é hoje.

Os bancos que financiaram essa enxurrada de endividamentos estão passando muito aperto. Alguns já quebraram, e os restantes emprestaram entre 10 a 35 vezes o valor do patrimônio real de que dispunham.

A situação atual: os bancos estão devendo todo mundo, as pessoas estão devendo todo mundo, e ninguém tem dinheiro para nada. Se ninguém tem dinheiro para nada, como é que as pessoas vão comprar coisas? E se elas não comprarem coisas, como é que as empresas que vendem coisas vão ganhar dinheiro? Sem dinheiro, as empresas começam a demitir funcionários, os desempregados não podem pagar suas dívidas aos bancos, os bancos não têm dinheiro para fazer nada, e assim a avalanche vai descendo a montanha.

A taxa de desemprego da Califórnia já chega a 7,7% contra 6,1% da média nacional. A tendência é que ambos os números cresçam ainda mais.

Agora quem vai se endividar como se não houvesse amanhã é o próprio governo federal dos Estados Unidos. O presidente Bush anunciou hoje que o governo vai investir duzentos e cinqüenta bilhões de dólares para comprar ações das empresas e bancos que estão próximos da falência devido ao endividamento. Ninguém quer usar a "palavra com E", mas o que eles vão fazer é estatizar parcialmente essas empresas para evitar que elas sejam gerenciadas de maneira ainda mais desastrosa. Isso vai impedir uma quebradeira generalizada, mas vai mandar o déficit fiscal dos EUA para a estratosfera.

A origem dessa dinheirama toda são os famosos Títulos do Tesouro. O "banco central" dos EUA emite esses títulos e vende no mercado. Agora o que eles vão tentar fazer é vender esses títulos a outros países - como se fossem uma empresa à beira da falência vendendo ações a novos investidores.

O problema é que nos EUA todo mundo está endividado até a raiz do cabelo. Governo, bancos, empresas, cidadãos - todo mundo está devendo até a alma. Quem é que vai confiar nesse sistema a ponto de comprar suas "ações"? Quem é que está disposto a emprestar esse dinheiro para os Estados Unidos, e qual será a taxa de juros cobrada?

Um dos principais clientes em potencial são os "países em desenvolvimento" ou "economias emergentes", que têm mais ou menos uns US$ 9.000.000.000.000,00 circulando no mercado (nove trilhões de dólares - estou escrevendo os números com esse monte de zeros para vocês terem uma noção visual do tamanho do problema).

A prova de que a coisa está mais feia do que parece foi o que aconteceu no último sábado, 11 de outubro de 2008. O presidente George W Bush desceu de seus tamanquinhos de cowboy e participou, humildemente, pela primeira vez na sua vida e em seus 8 anos de governo, de uma reunião do G20.

Quando o líder máximo dos EUA precisa pedir esmola aos seus amigos mexicanos, chineses, africanos e brasileiros, é porque estamos mesmo à beira do abismo.

3 comentários:

Rafael e Angela disse...

Olha só, nós é que vamos pagar a conta!

Rogério Brittes disse...

O que mais me intriga nessa crise é que raramente alguém fala: "isto está ocorrendo por causa disso e disso". Parece que realmente o mercado é um ser com vontade própria, que de repente fica "eufórico" ou "tenso", "assustado" e começa a fazer todo mundo perder dinheiro e os frangos do interior de SP morrerem de fome. Ninguém aponta para a péssima política economica do Bush, pra começar. Que o Clinton tava caminhando pra zerar a dívida pública americana antes que o Texas Ranger entrasse na Casa Branca. Ninguém lembra que os mecanismos de controle dos bancos centrais são meio marmelada quando o referencia é este neoliberalismo bizarro que andava comandando. Agora vão ter que estatizar tudo. Espero que lembrem que a Social Democracia sempre foi mais segura e justa, e o mundo vire uma grande Suécia dos anos 80.

Lia disse...

Excelente resumão. Eu recomendaria para o vestibular. Mesmo.

Agora, por mais que Obama esteja pouco na frente nas pesquisas, essa diferença ainda é pouca para realmente fazer diferença: vale lembrar que o sistema de votação dos Estados Unidos, com pesos diferentes por estados, pode produzir resultados muito imprevisíveis...