10 de setembro de 2008

Das limitações ofensivas da língua portuguesa

Desde a mais tenra idade que eu ando em busca do xingo perfeito. Aquela palavrinha sagaz, curta, sonora, boa de ser gritada, que contenha o máximo de ofensas possível, mas digna de ser dita por um cavalheiro, por mais puto que ele esteja.

Os xingamentos comuns não funcionam muito bem. Primeiro porque já foram usados tantas vezes que perderam o efeito. Filho-da-puta por exemplo, desvia a atenção da ofensa à mãe do ofendido. Além disso, não vejo problema nenhum em uma mulher ser puta, e não acho que isso devesse ser uma ofensa. Viado não tem graça, primeiro porque é meio homofóbico, e segundo que viado é apenas um animalzinho inofensivo da floresta. Cagão é meio aleatório e genérico demais, e pode até mesmo ter outros significados. Aqui em BH por exemplo, "cagão" é um cara muito sortudo. Bunda-mole até que vai, mas é pouco ofensivo e a palavra é meio comprida, composta, com hífen ainda por cima. Corno tem o mesmo problema de filho-da-puta: redireciona a ofensa a outra pessoa. Além disso, se a mulher do ofendido o trai com outro homem (ou mulher), por que ele deveria ser ofendido? Ele foi traído, isso sim. É a vítima da história. Eu quero uma ofensa!

Um dia eu pensei que tinha encontrado o xingamento perfeito: burro! É sonoro e bom de gritar - todo mundo sabe que o U, quando bem gritado, é a vogal mais apavorante do alfabeto, seguido de perto apenas pelo I. O problema é que o burro é outro animalzinho super simpático que não tem nada a ver com o peixe. Além disso, aqui no Brasil, ser ignorante ou idiota é mais motivo de orgulho do que de vergonha, por isso não acho que seja um xingamento muito ofensivo.

Em momentos de dúvida ou crise, eu sempre apelo para os antigos. E eles sempre nos trazem palavras altamente inspiradoras. Canalha, por exemplo, é um ótimo xingamento. Filisteu é uma boa palavra, mas é um xingamento meio cristão demais para o meu gosto. O mesmo vale para Judas.

Eu sempre me recordo do Capitão Haddock, amigo do Tin-Tin: Flibusteiros! Bucaneiros! Marinheiros de água doce! O legal dos xingamentos dele é que têm a ver com a profissão dele, ou seja, ele resume o mundo ao trabalho dele e qualquer um que faça mal aquele trabalho ou atrapalhe seu trabalho é considerado um inimigo, um errado, um antagonista, e por isso as palavras para descrevê-los soam para ele como os piores xingamentos possíveis.

Pensando nisso concluí que o xingamento é uma coisa muito importante na vida de uma pessoa, pois expressa o que realmente somos lá no âmago do nosso ser. Quantas vezes não vi uma menininha fofinhas, de 18 aninhos, linda leve e loura em seu modelito Belvedere, em um acesso de raiva soltar os palavrões mais racistas, sexistas e fascistas possíveis. A maioria das pessoas, se ficar com raiva de uma pessoa preta, vai usar xingamentos como macaco, favelado, etc. Vai chamar uma mulher de burra, de gorda, e outras coisas do tipo, dependendo da pessoa ofendida no caso. É no ódio que se revela a real faceta do ser humano, e é no momento do acesso de fúria que sabemos quem é realmente uma pessoa.

Tudo muito bonito, mas até agora eu continuo sem um xingamento para mim.

Acho que a saída vai ser usar o barulho sem palavras. Estou pensando em comprar uma daquelas buzinas em spray, ou então um apito, que é mais portátil para andar na rua.

Mas sei lá. Não é a mesma coisa.

5 comentários:

Americano disse...

genial o texto! eu por exemplo nunca tinha parado pra pensar sobre os xingamentos do Capitão Haddock. Faz todo sentido.

agora, a nível de ofensa ofensiva, nenhum xingamento supera oligofrênico. É quase a mesma coisa de burro, com a vantagem de não ofender o simpático animal comparando-o com seres humanos com qi de dois dígitos. além de tudo soa bacaninha também.

Alexandre Nix disse...

Pulha!

Fritélix disse...

Use palavras finas:
Pacóvio
Parvo
Patal
Biltre
Boçal
Energúmeno
Uma vez fiz uma lista para ofender elogiando! Ahe seu pacóvio!
E o sujeito ria, se achando!
Abç,
Fidel

letícia disse...

sempre penso nisso e optei por "meu cu", que é um termo curto, forte e sonoro (tem dois us! =). além disso, não é uma ofensa, nem faz referência a outrem. eu digo "meu cu" e a violência contida na frase evola-se. é quase um exercício zen. uma beleza.

bj!

nice lopes disse...

um bom xingamento é aquele que ofende a pessoa no que ela considera ter de mais valioso...uma vez xinguei um cara na faculdade de "pseudo-intelectual", meu Deus! ele quase me bateu, rs! se eu o tivesse xingado de "baitola", "burro" ou "flha da p*" ele não teria se ofendido tanto, rs..."analfabeto" pra quem se acha muito letrado funciona bem, as pessoas ficam verdes de raiva..."medíocre" é o meu preferido, quase ninguém entende mas se ofende bem...seus textos sempre muito bons, hein, Poeira?! Besos!