27 de agosto de 2008

"Nosso primeiro beijo foi no McDonald's"

Li essa frase em uma Playboy brasileira e fui tomado de assalto. Que poder de síntese! Tudo que está errado no mundo, resumido em um singelo conjunto de 6 palavrinhas.

Nosso... primeiro... beijo... foi... no... McDonald's...

Não foi em um lugar fechado, não foi em um lugar escuro, e nem aconchegante. Não foi escondido atrás da pilastra, não foi dentro do carro debaixo da chuva, não foi no cinema, e muito menos na cama ou no sofá. Não foi na casa de amigos, na boite, na praia, nada. Foi no McDonald's. Onde tudo é branco e iluminado e barulhento. Foi no meio de um mundaréu de gente comendo comida da pior qualidade. Nosso primeiro beijo foi com cheiro de gordura podre.

Bem... e o que eu podia esperar? A Playboy brasileira já deixou, há muito tempo, de ser um oásis de bom gosto. Compare uma edição do início dos anos 1990 com uma de hoje em dia e você vai ver uma clara diferença. O leitor médio de Playboy, outrora um bebedor de boas bebidas e comedor de boas mulheres, é hoje um cidadão comum, fã de futebol e de mulatas com a bunda desproporcional. Não aprecia as fotos por sua beleza estética, e pelo casamento harmonioso entre a habilidade e o bom gosto do fotógrafo e as formas inebriantes das convidadas. Não, nada disso. O que importa é se a mulher é famosa. No mundo da fama de 15 minutos, queremos ver peladas as meninas do BBB, as meninas da CPI, as meninas do Créu, a ninja do funk, e qualquer outra coisa desse nível. Antes, quem decidia que mulher era desejável ou não, era o Hugh. Agora, é o Huck.

É o poder infinito que a sociedade de consumo tem de estragar tudo, até mesmo o que ela própria criou. Caiu o mito da revista para homens refinados, a revista que separava os homens dos moleques. A revista que você lia quando virava homem, e que dizia o que havia de mais chic e elegante no momento. A revista das entrevistas gostosas e das mulheres inteligentes. Acabou. O que restou foi uma mistura de Revista Placar com ficar olhando pra janela da sua vizinha na esperança de ver ela pelada de costas e torcer para ela ser mais ou menos bonitinha.

Mas a realidade é dura. Temos que encarar. Vivemos em um mundo de primeiros beijos no McDonald´s.

Para mim, é fácil e cômodo pensar "cada um sabe o que merece". Mas não consigo deixar de ficar com pena dessas pessoas. O que foi que nós fizemos para merecer isso? Que culpa temos nós, que precisamos expiá-la nos privando de tudo o que havia de mais humano, saudável, belo e poético nesse mundo? Eu pensava que no futuro, onde vivemos hoje, as pessoas teriam que se privar de água potável e carros movidos a gasolina. Mas agora vejo que isso é o menor dos nossos problemas.

Viver sem água potável e sem gasolina é perfeitamente possível. Mas viver sem romance? Que graça há nisso? O homem médio do século XXI não vive: sobrevive, em meio a um deserto de significado, onde nada vale nada, nem mesmo o dinheiro. Tudo o que ele pode querer é malhar o bíceps, comprar roupas ridículas, beber sem sentir o gosto, e dirigir uma caminhonete bem poluente em plena cidade grande. Seus sonhos de consumo são uma casa, um carro, e uma TV de plasma.

Ah, e comer a enfermeira do funk.

Nenhum comentário: