23 de janeiro de 2008

Meu grande amigo Fernando Francês mandou esse link sensacional:

http://pukeko.otago.ac.nz/~jp30/flags/meth.html

é o trabalho de um cara que fez a análise técnica de todas as bandeiras de países e territórios do mundo, deu notas e prêmios especiais (i.e. "me deu vontade de vomitar", "tem estrelas demais", etc.).

Foi bom saber que mais alguém é obcecado com bandeiras como eu. Quando eu tinha 2 anos de idade e meu irmão chegou da maternidade, a primeira coisa que eu fiz foi ensinar pra ele as bandeiras do mundo, que eu sabia de cor e mostrava em papelzinho arrancado de algum Almanaque Abril ou coisa parecida. Lá em casa também tinha um dicionário ilustrado com umas páginas que tinham todas as bandeiras do mundo, e elas estão podres e amassadas de tanto eu brincar com elas.

Eu discordo de algumas notas e comentários do cara - sobre a bandeira da Suécia por exemplo - mas em geral o trabalho dele é bastante interessante e engraçado (vide o comentário sobre o Paquistão!).

Uma coisa interessante de se notar é que, em geral, quanto mais "livre" o país, mais limpa é a bandeira, e vice-versa. Essa liberdade não é apenas uma questão de governo, mas de sentimento geral da população como um todo. Deixa eu tentar dar um exemplo: uma das bandeiras mais horríveis e rebuscadas do mundo é a bandeira de Portugal. Isso não significa necessariamente que esse país passou muitos séculos sob o jugo de algum ditador, mas todo mundo sabe que o povo português é, em geral, muito reprimido e "cristão". Não é à toa que eles foram os grandes desenvolvedores da arte barroca, aquela coisa rebuscada e opulenta cheia de culpa cristã, dourados e detalhes inúteis.

O Japão, por outro lado, tem uma bandeira incrivelmente limpa e bem desenhada. Aquela bolinha vermelha no fundo branco é um clássico imortal do design, e só foi substituída em tempos de guerra, por uma bandeira cheia de risquinhos inúteis que, felizmente, findo o conflito, desapareceram do estandarte nipônico e deram lugar à bandeira clássica e tradicional, que é uma verdadeira aula de como se faz um bom design.

Os países da África em geral têm bandeiras medonhas, não porque eles não tenham boas escolas de design (e nem devem ter mesmo - mas, hoje em dia, que país tem?) mas porque são países muito complicados política e humanitariamente falando. Por exemplo: reparem como as bandeiras do norte da África são mais limpas e bem desenhadas do que as do centro-sul daquele continente. Em países africanos de antiga tradição islâmica, razoavelmente civilizados há muitos séculos apesar de conflitos recentes, têm, em geral, bandeiras bonitas e limpas. É o caso por exemplo da Argélia, do Marrocos e da Somália, que foi o quarto colocado geral na lista do cara. Já os países mais, como direi... "complicados"... têm bandeiras igualmente complicadas. Vejam por exemplo a bandeira de Angola, que tem um pedaço de engrenagem e um facão de cortar cana (e cabeças). Ou a da República Centro-Africana, uma verdadeira explosão carnavalesca de cores inúteis.

E como fica o Brasil nessa história toda? Esse país tão livre, democrático, alegre... bem... entrem no site e vejam vocês mesmos...

21 de janeiro de 2008

My Back Pages

Bateu meia-noite, e subitamente eu tenho 29 anos de idade. Bom, na verdade não... estamos no horário de verão, então ainda tenho alguns minutos pela frente... sem contar o erro de 6 horas que ajustamos a cada ano... se bem esse ano é bissexto, tem olímpiada...

Nem comecei a escrever e já estou divagando. Eu sempre fico assim no meu aniversário. Pensando na vida. É estranho que ele seja tão perto do reveillon e do natal, que são datas mais comuns de ficar pensando na vida e ficar fazendo planos para o futuro, ou de ficar olhando para o passado e analisando o que passou. Mas eu prefiro fazer isso no meu aniversário. Geralmente no natal e no reveillon eu estou ocupado demais conversando com as pessoas e passando pelo meu inferno astral, que é sempre bastante infernal.

Bom, onde eu estava há 1 ano atrás? Foi um aniversário meio louco. Eu tenho essa convicção, embasada por livros de biologia, de que a cada 7 anos a gente vira outra pessoa. Literalmente. E isso é fato: 7 anos é o tempo que o corpo humano leva para substituir 100% de suas células. Então quando eu fiz 28 anos eu inaugurei o Daniel 4.0 - que agora está sendo atualizado para ser o Daniel 4.1, que só vai virar Daniel 5 quando eu fizer 35 anos.

Apostando alto nessa idéia de virar outra pessoa, senti que 2007 foi um ano bem diferente para mim. Aproveitei a deixa e mudei meu comportamento, minhas atitudes, meus preconceitos e minhas limitações. Certamente foi um ano bastante conturbado, cheio de mudanças radicais na minha vida: além de voltar a morar com meus pais, tive um projeto aprovado na lei de incentivo da prefeitura e, pela primeira vez na minha carreira, estou tendo a oportunidade de fazer um filme de animação "sério". Isso significa ter uma equipe, pagar salários, e ter que fazer coisas bizarras como explicar o que eu estou pensando e mudar o meu filme por causa de outras pessoas. Está sendo uma experiência muito bacana, e estou podendo botar em prática muitas coisas que eu estudei no mestrado mas nunca tinha tido a chance de fazer na vida real.

Outra mudança importante na minha vida começou no reveillon: estou controlando melhor minha alimentação e praticando esportes. Diminuí algumas coisas, sem cortar nada da dieta, tomando mais líquido e comendo menos açúcar. Continuo bebendo bastante, muito mais do que o Daniel 4, e isso tem sido muito bom. Descobri novos sabores que eu sequer imaginava possíveis, e hoje coloco a arte de fazer drinks lá em cima no meu conceito. É um mundo realmente fascinante e que só alegria me trouxe, e estou aos poucos mostrando esse munto para as pessoas à minha volta, que estão descobrindo comigo que beber é um hobby muito refinado e interessante - mas sem aquela viadagem do caralho que os fãs de vinho costumam cultivar.

Mas com certeza a maior mudança que aconteceu na minha vida entre os 28 e os 29 anos de idade foi o meu círculo de amizades. Reencontrei alguns velhos amigos e conheci alguns novos, e esse conjunto todo provou ser o melhor grupo de amigos que eu já tive na vida. Alguns demoraram um pouco para acostumar, outros viraram irmãos em pouco tempo, e o fato é que o Daniel 4.1 pode se dar por contente por conhecer tanta gente boa. Pessoas muito diferentes umas das outras, mas que têm em comum o senso de humor afiado, a diversão sem limites, e o fato de serem pessoas boas e honestas sem serem babacas, e que acreditam em melhorar o mundo sem demagogia e com os dois pés bem firmes no chão. Não sei o que seria de mim sem eles, e em 2008 vou me esforçar ao máximo para retribuir tudo que eles já fizeram por mim.

Tudo isso - os esportes, a bebida, os amigos - me faz sentir muito mais jovem do que eu me sentia em 2006. Acho que o segredo de envelhecer bem é esse: manter o corpo e a cabeça em boa forma, seja desenferrujando os joelhos e a coluna ou o coração. Usar sempre todas as partes do corpo, principalmente o pulmão, o cérebro e o fígado!

Obrigado a todos que me ajudaram a chegar aos 29. Vejo vocês terça-feira na Obra.

19 de janeiro de 2008

Post #54!!! ROOOCCCKKKKKKKKK!!!!!!!

Caros amigos, como o Orkut já deve ter-lhes lembrado, meu aniversário está chegando.

Como eu sou um cara muito sortudo, tenho vários amigos nessa vida, e alguns deles fazem aniversário em dias próximos ao meu. Por isso nos reunimos todos e vamos fazer uma grande festa na próxima terça-feira dia 22 de Janeiro.

A festa será no bar A Obra, a partir das 22:00h e a entrada custa a bagatela de 5 reais.

O som da festa será muito animado com hits dançantes dos estilos mais variados que vocês puderem imaginar - incluindo swing, ska, hip-hop, e vários tipos de rock!

Conto com a presença de todos, tenho certeza que vai ser uma festa inesquecível... a não ser é claro que vocês exagerem na vodka.

Qualquer dúvida é só escrever para danielpoeira@gmail.com

Vejo vocês lá!


/// BAILE DOS ENXUTOS :: A OBRA :: TERÇA 22 JAN :: 22H00 :: $5,00 ///

17 de janeiro de 2008


"Most people are other people. Their thoughts are someone else's opinions, their lives a mimicry, their passions a quotation."

- Oscar Wilde

16 de janeiro de 2008

O virtual na era do amor


Criei um monstro. Lendo uma frase no blog do Rafael, fiz a ele alguns questionamentos, que ele respondeu, e eu agora para contra-responder vou precisar de um post inteiro e enorme.

Foi assim que tudo começou, no final de um parágrafo dele:

"Imagino a mãe desse menino vendo essas demonstrações tão profundas de amor. E o que é mais virtual do que o amor, hein? Mais desprendido, mais sutil e belo do que isso, essas demonstrações gratuitas de bem-querer."

Mandei então o seguinte comentário:

"Estava aqui relendo e pensando nessa coisa do amor ser virtual. É muito assunto para se pensar. Até onde o amor é virtual? E de quem é a "culpa" disso? Até que ponto devemos deixar isso assim mesmo, e a partir de que ponto podemos exigir mais desse tal de amor - já que não depende só da gente? Lembrando que amor não é só casamento, tem muitos tipos de amores..."

Ao que ele então respondeu:

"O virtual tinha entrado na parada meio por acaso. Mas disso tudo que você falou, também compactuei com sua dor de cabeça. Primeiro: eu estou usando uma noção suja de virtual, sem me preocupar muito com o Baudrillard ou sei lá quem. Eu falo que o amor é virtual porque ele não é sempre perceptível; ele é sempre algo atualizado, que desatualiza, se "esquece", e aí que se sustenta no espaço virtual, mas que não está ali, em cima da mesa. A questão talvez seja se desse virtual ele se atualiza de fato, se faz presente, em sorrisos, flores, e músicas americanas bregas traduzidas na BH-FM. Ou seja, se o que não existe como dado concreto e real, certo e previsível, se faz presente em algum momento. Agora, se o que se faz presente é amor, interesse, ou tesão, isso é um outro problema...

Acho que o amor depende só da gente mesmo. Falo do amor de cada um. Não acredito que o amor seja uma relação entre duas pessoas com igual combinação de transmissão de afeto. O amor tem a ver com a entrega ao outro, entrega de você. Do que lhe é importante. A expressão "fazer algo com amor" cai bem aqui. As pessoas podem se fechar tanto não deixando sair nada, como podem deixar sair tudo não saindo nada importante.

Mas tudo isso é foda, porque o amor é bonito pela sua virtualidade, por depender de coisas sutis mas profundas, e não de garantias pré-dadas. Uma ex-namorada minha dizia que "amor é pra vida toda, portanto, se não foi pra vida toda não foi amor". Resolve todas as equações do mundo, mas é falso e todo mundo sabe, inclusive ela. Acredito (sim eu sou piegas) que o amor é o momento em que você se sente no melhor lugar do mundo por causa daquela pessoa ali. Ou daquelas. (eu falo de amizade e não poligamia) Isso não acaba, mas vai e volta. Necessita de ser atualizado em momentos e situações diferentes, porque não é uma relação de almas eternas. É uma relação entre seres humanos contingentes e fracos.

"Exigir mais desse amor" é uma dessas sentenças que eu não entendo muito. Porque acho exigir algo estranho à minha idéia (sim, um tanto psicanalista e naturalista, de um passado bom) de amor. A questão do amor é a recíproca. Acho que quando o filme de comédia romântica americano ridículo funciona, rola uma sensação de completude. Você viu "Penetras Bons de Bico"? O casal principal transmite um pouco a idéia de que haveria uma necessidade dos dois viverem juntos para frente, o que nunca, mas nunca mesmo é verdade."

Bom... e então, o que eu respondo? Não sei. Preciso pensar.

Mas eu gosto de pensar escrevendo.

O que eu queria dizer com a minha provocação inicial era o seguinte: amor virtual, pra mim, é só o amor platônico, aquele que só acontece no campo do imaginário. Mas me vejo forçado a questionar essa idéia. Porque amor que não acontece, não é amor. É só uma paixãozinha que nunca sai da vontade, que nunca se concretiza. Fica aquela coisa distante, fria, covarde. Até casais virtuais que se conhecem pela Internet acabam por se encontrar fisicamente no mundo real, e muitos deles se casam e vão morar juntos. O que é, então, um amor virtual? Não sei. Mas acho pouco.

Fico cansado de tanto ver gente que fala muito e não faz nada. Que diz que gostaria de fazer tal coisa mas passa a vida reclamando de bar em bar sem nunca tomar uma atitude na vida. Dizem que gostam de uma coisa, mas nunca se aproximam - apenas observam, distantes, como se a vida fosse só uma vitrine no shopping. Eu acho isso o fim da picada. Pra que é então que serve a vida? Se não for para amar, se apaixonar, se dedicar, então ela é muito chata. Não importa o que seja: tem que haver paixão, amor, entusiasmo, vontade. Eu dou muito mais valor a um corredor de stock car ou a um folião de trio elétrico do que a esses intelectuaizinhos de boteco que passam a vida se arrastando de existencialismo em existencialismo, lendo livros e vendo filmes, totalmente alienados do processo de viver.

Essa virtualidade do querer, essa preguiça de ser feliz, é tudo um grande sintoma do nosso século. Não sei explicar exatamente como nem por que nem se existe cura para isso, mas estou pensando no assunto há muito tempo. Tudo o que sei é que a única coisa que muda sozinha com o tempo é o clima. Chove, venta, o sol aparece, a noite cai, neva - a natureza não pára nem um segundo. Mas todo o resto, nossas relações, nosso emprego, nossos hobbies - tudo isso depende da gente. Tem que querer fazer e tem que fazer também. Querer não é poder. É só uma encheção de saco.

Quanto ao amor ser para sempre, eu também discordo. Acho que as pessoas se repetem isso para acreditar em "algo mais", que seja eterno. Mas nada é eterno na natureza. Bom, talvez a estupidez humana. Mas o amor, não. Porque o amor é feito de pessoas, de lugares e de momentos, e tudo isso muda o tempo todo. Você pode amar uma pessoa hoje, e um belo dia descobrir que não ama mais - porque ela se tornou outra pessoa, e você também se tornou outra pessoa.

Como diria o grande filósofo Odair José: "Felicidade não existe, o que existe na vida são momentos felizes".

Interrompemos esse blog para uma propaganda totalmente descarada.

É que eu estou lançando dois novos blogs!

Poeira Discos é um blog de downloads de discos. São vários discos muito loucos e extremamente raros que eu estou disponibilizando para o povo gratuitamente. E o melhor: ao invés do maldito RapidShare, estou usando torrents abertos, livres, gratuitos. Qualquer um pode chegar e baixar.

Não Vi E Não Gostei é um blog de críticas e comentários sobre cinema. Tem resenhas dos filmes que eu assisto, e de vez em quando deve ter algumas outras coisas como biografias e comentários aleatórios em geral, sempre relacionados com cinema.

Divirtam-se!

7 de janeiro de 2008

O Universo te ajuda?


Existe uma frase solta no espaço que diz que basta você desejar alguma coisa que o universo conspira a seu favor. Acho que li isso em um quadrinho do Paulo Coelho - 'Maktub', saía na Folha de S. Paulo - e já vi muita gente citando isso por aí como uma forma de programação neuro-lingüística.

Já vi também pessoas dizerem que essa citação estava errada, e que a original era de Goethe e dizia assim "seja corajoso, e o universo conspirará a seu favor". Faz mais sentido, mas ainda é uma grande abobrinha.

Pois bem. Nem no Google nem na Wikiquote existem quaisquer sinais de que Goethe tenha dito algo do tipo. Nem mesmo na sessão "atribuídas erroneamente" da Wikiquote essa citação aparece, ou qualquer outra que faça referência a conspirações universais.

Considerando que Johann Wolfgang von Goethe não era exatamente um retardado mental, eu diria que ele não disse nada disso. O Universo? Conspirar a favor de alguém? Nem se eu ganhasse na Loteca 5 vezes seguidas eu poderia me dar ao luxo de acreditar em uma abobrinha dessas. Quem fala e repete esse tipo de lorota certamente nunca leu um livro de História, ou a coluna policial do jornal - ou sequer colocou a cara na janela de casa e viu o mundo real ali na esquina. Só gente louca, dessas que embrulham sementinhas de romã em dólar, é que acredita cegamente que o Universo - essa coisa indefinível, que ninguém sabe direito se é finita ou infinita - iria ajudar um reles ser humano.

Vejamos o que nosso amigo Goethe tem a dizer sobre o Universo:

"Não precisamos visitar um manicômio para encontrar mentes desordenadas; nosso planeta é o manicômio do universo." - Goethe

4 de janeiro de 2008

Eu sou tipo um milagre


Não sei quanto aos amigos leitores, mas eu tenho a péssima mania de relembrar a minha infância. Digo péssima porque, geralmente, nesse processo, eu acabo me lembrando de coisas bizarras que explicam - e muito - por que diabos eu me tornei quem eu sou hoje em dia. Algo assim como aquele livro "Minha Formação", do Joaquim Nabuco? Só que a versão punk anos 80. Deixa eu explicar melhor.

No livro do Nabuco (e toma trocadilho) ele fala coisas lânguidas e pitorescas, tais como:

"(...) poesia real, verdadeira, no alimento são, natural, pátrio; há sentimento, tradição, culto de família, religião, no prato doméstico, na fruta ou no vinho do país. A nós, do norte do Brasil, criados em engenhos de cana, o aroma que rescende das grandes caldeiras de mel nos embriaga toda a vida com a atmosfera da infância. E assim como há poesia na cozinha de cada país, há um quid de arte na cozinha ornamental, cozinha de refinamento, que se procura elevar pelo desenho e pela forma até o motivo do banquete, – e fazer história, fazer política..."

Olha, doutor Nabuco... eu tou fazendo um Bauru aqui e... vai alface??

Devia ser muito fácil ser um gênio intelectual antigamente. Você nascia rico, estudava em colégios super repressores, lia muito, não tinha televisão, não tinha chiclete, nem Playboy, nem filme de bang bang, enfim, não tinha merda nenhuma pra fazer; e aí você desperdiçava sua infância inteira com literatura, observação de pássaros, roubar frutas no pomar do alheio e ficar correndo para cima e para baixo com um carrinho de lata de goiabada ou empurrando um aro com um pedacinho de pau.

A minha infância se passou no asfalto, entre video-games, programas da Xuxa, gibis da Mônica e do Pato Donald, Comandos em Ação, Forte Apache e outras mazelas culturais. Eu destruía meus dentes com chiclete e sorvete, passava New Wave no cabelo (que caiu, obviamente) e jogava Ranca com minhas botinhas Bubblegummers.

Considerando tudo isso, eu acho um milagre que eu tenha terminado a quarta série. O que dirá entrar no doutorado.

Gostaria de, algum dia, sentar-me à sombra do jacarandá - em um majestoso notebook - e escrever as memórias de minha infância, tal qual Nabuco em sua soberana prosa... apenas com uma pitadinha da dura realidade das ruas. E do que foi ser criança naqueles pavorosos anos 80.

Difícil é ter estômago para tanto.

3 de janeiro de 2008

Feliz 2008 (se você quiser)

Eu não acredito que uma data comemorativa possa mudar a sua vida. Mas eu acredito que você, em uma data comemorativa, possa mudar a sua própria vida.

A diferença parece sutil, mas é crucial. Quando você acredita que uma data, ou que o tempo em geral, podem mudar alguma coisa, você está deixando o seu destino nas mãos do acaso, acreditando em alguma coisa abstrata qualquer (Deus, destino, etc.) que vai manipular o Universo a seu favor. Coisa de fãs de Paulo Coelho*.

Já no segundo caso, você, pessoa, pode decidir que, em determinada data, você vai fazer alguma coisa. Sem a ajuda de Jesus, dos espíritos dos seus ancestrais, ou de Urano. Você vai lá e vai agir. Tomar as rédeas da vida em suas próprias mãos e dominá-la, governá-la, decidir para onde é que ela vai.

Na verdade não é assim tão simples. A vida não é bem uma carroça, com rodas, e cavalos, num solo rígido e firme. É mais como uma prancha de surfe, deslizando muito rápida em um oceano de água líquida. Se você vai rápido o suficiente, a prancha desliza e te leva para frente em uma velocidade vertiginosa. Se você não agüenta a força da onda, ou fica com medo dela, acaba afundando na água. Pode se afogar, pode ser comido por um tubarão, ou pode apenas ficar entediado, boiando lá que nem uma folha seca.

Metáforas à parte, o fato é que em determinadas datas eu me dou ao luxo de decidir algumas coisas para a minha vida. Meu aniversário é uma dessas datas. E o reveillon é outra.

Todos os "especialistas" (no rádio e na TV eles nunca dizem especialistas em quê) dizem que, para você conseguir realizar suas promessas de ano novo, precisa ser modesto, e prometer coisas que você realmente possa realizar. O que eles querem dizer com isso é que, ao invés de prometer tudo, você deve apenas fingir que prometeu alguma coisa útil. Por exemplo, ao invés de dizer "eu vou emagrecer 100 quilos" deveria dizer "eu vou parar de comer 10 quilos de batata frita por dia e comer apenas 5".

Esse raciocínio tem fundamento, mas é muito enganador. Por que diabos você deveria fazer isso? Para não se decepcionar porque não cumpriu o que prometeu? Se você não cumpriu sua própria promessa, é porque não teve competência para tanto, ou disciplina, ou coragem, ou força de vontade. Não é culpa da sua promessa! E você não deve nunca se decepcionar consigo mesmo: apenas analisar o que deu errado, corrigir os problemas e seguir em frente.

É que nem aquelas pessoas que sempre chegam atrasadas em tudo, e aí então atrasam os relógios da casa para fingir que vão chegar na hora certa. É uma atitude ridícula, de auto-enganação, típica de quem gosta de viver em um mundinho de fantasia onde tudo é uma grande casinha da Barbie. Não dá para ir muito longe na vida se auto-enganando. Se você sempre chega atrasado, saia mais cedo de casa. Ponto final. Não adianta manipular os relógios da sua casa: você não pode manipular o tempo. Os relógios são apenas um indicador da passagem do tempo, e não as engrenagens que o fazem funcionar.

Isso vale para tudo na vida. Você não pode controlar o Universo. Ao contrário dos super-heróis - que nunca estiveram tão em moda no cinema e na TV como hoje em dia - nenhum de nós pode viajar pelo tempo, voar, controlar pensamentos ou levantar objetos apenas com o poder da mente. Somos apenas seres humanos normais, que morrem, apanham, passam fome, frio, solidão - e quem não estiver preparado para conviver com isso, que procure um psicólogo. Conheço uns ótimos.

Resumindo: minhas resoluções de ano novo foram radicais, mas até agora estão indo bem, obrigado. Não precisei sofrer por nada até agora, minha vida está melhorando aos pouquinhos, mas sinto que no próximo reveillon vou ter que inventar umas promessas muito loucas, porque as mais óbvias do mundo que eu vinha protelando há anos eu fiz todas de uma vez, e agora as estou cumprindo todas com muita alegria e dedicação.

Recomendo a todos que queiram mudar de vida que não procurem nem as drogas, nem as prostitutas, nem as grandes corporações, nem a arte: procurem dentro da sua própria cabeça. É lá dentro que a sua vida acontece. Não é em Hollywood, nem na Internet, nem no seu celular. É na terra, no ar, na água, no fogo, e na cachaça.

* O mago da ABL manipulou uma citação de Goethe com resultados desastrosos, que comentarem em breve nesse blog.